sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

O contrario do amor, por Marta Medeiros.


O contrário de bonito é feio, de rico é pobre, de preto é branco, isso se aprende antes de entrar na escola. Se você fizer uma enquete entre as crianças, ouvirá também que o contrário do amor é o ódio. Elas estão erradas. Faça uma enquete entre adultos e descubra a resposta certa: o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença.
O que seria preferível, que a pessoa que você ama passasse a lhe odiar, ou que lhe fosse totalmente indiferente? Que perdesse o sono imaginando maneiras de fazer você se dar mal ou que dormisse feito um anjo a noite inteira, esquecido por completo da sua existência? O ódio é também uma maneira de se estar com alguém. Já a indiferença não aceita declarações ou reclamações: seu nome não consta mais do cadastro.

Para odiar alguém, precisamos reconhecer que esse alguém existe e que nos provoca sensações, por piores que sejam. Para odiar alguém, precisamos de um coração, ainda que frio, e raciocínio, ainda que doente. Para odiar alguém gastamos energia, neurônios e tempo. Odiar nos dá fios brancos no cabelo, rugas pela face e angústia no peito. Para odiar, necessitamos do objeto do ódio, necessitamos dele nem que seja para dedicar-lhe nosso rancor, nossa ira, nossa pouca sabedoria para entendê-lo e pouco humor para aturá-lo. O ódio, se tivesse uma cor, seria vermelho, tal qual a cor do amor.

Já para sermos indiferentes a alguém, precisamos do quê? De coisa alguma. A pessoa em questão pode saltar de bung-jump, assistir aula de fraque, ganhar um Oscar ou uma prisão perpétua, estamos nem aí. Não julgamos seus atos, não observamos seus modos, não testemunhamos sua existência. Ela não nos exige olhos, boca, coração, cérebro: nosso corpo ignora sua presença, e muito menos se dá conta de sua ausência. Não temos o número do telefone das pessoas para quem não ligamos. A indiferença, se tivesse uma cor, seria cor da água, cor do ar, cor de nada.

Uma criança nunca experimentou essa sensação: ou ela é muito amada, ou criticada pelo que apronta. Uma criança está sempre em uma das pontas da gangorra, adoração ou queixas, mas nunca é ignorada. Só bem mais tarde, quando necessitar de uma atenção que não seja materna ou paterna, é que descobrirá que o amor e o ódio habitam o mesmo universo, enquanto que a indiferença é um exílio no deserto.

7 comentários:

Meu Manifesto disse...

Não é a toa que muitas pessoas queriam voltar a ser crianças...

Thiago Sampaio disse...

Bom mesmo o texto mlk, e como ela diz, é melhor batalhar no ódio do que caminhar sozinho na indiferença.

Pati disse...

Indiferença é horrivel, é até pior que o ódio. ~;

Críticas de cinema, www.cafedefita.blogspot.com ;D

Diego? Glommer? disse...

Como dói a indiferença... Principalmente se ela um dia já foi amor.

Abraços libertários!

Pobre esponja disse...

E os indigentes?
Só não os atropelamos por nojo (digo, a maioria, porque eu sempre ajudei tal). Tem gente que vira invisível, e só se torna visível quando vira a ameaça, que poderia ser evitada se avistassemos um ser carente antes.

abç
Pobre esponja

Anônimo disse...

Ah, Martha Medeiros é Martha Medeiros e isto não se discute, não é!?
Sou leitora e portanto conhecedora de tudo o quanto ela escreve.

O seu blog tem conteúdo. Gosto disto!
Passe também no meu quando tiver um tempo, vou adorar.

Um beijo.

http://praondefor.blogspot.com/

Anônimo disse...

Ps. escrevi algo (parecido) como ser criança...
Julgo-me de vilã por ter crescido e sugiro que jamais abandonemos o espirito infantil, mas no sentido de que não deixemos de lado os nossos sonhos por conta dos compromissos com que, como adultos, nos envolvemos.

O post se chama "Animus".

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